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Entre ser cruel, ser justo e ser ambos

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You made a fool of me But them broken dreams have got to end ----- Eis um começo de história que vários amigos já tiveram que tolerar: umas semanas atrás conheci uma guria pelo Tinder. O começo da interação foi um pouco difícil — ela era do tipo que não conferia o app com frequência (compreensível; também tenho tido pouca paciência para ele) e acabava me deixando no vácuo; até chegou a passar uma semana sem me responder, mas toda vez que tornava a aparecer oferecia desculpas sinceras e eu as aceitava. Quem leu meu texto anterior sabe que relações unilaterais têm sido gatilho de depressão na minha vida, mas resolvi me dedicar neste início de interação porque entendia que ela possuía uma rotina atribulada e tinha a impressão de que éramos parecidos em praticamente todos os pontos que acho importantes. Meu investimento de atenção e empenho compensou quando tivemos nossas primeiras conversas longas e substanciosas, desta vez sobre a vida, preferências e questões ideológicas. Estava saudave

Poço de reciprocidade

Poucas coisas me machucam mais do que a sensação de uma relação unilateral. Isso já me levou à depressão algumas vezes e, sendo sincero, luto para que o momento que vivo não se torne mais um destes. Há anos sinto que minha dedicação a amizades e envolvimentos afetivos (tanto possíveis quanto concretizados) é maior que a recebida. A minha mente adoecida me dizia que reclamar disso seria egocêntrico ou pedante, mas felizmente o sentimento foi validado por uma amiga próxima. No entanto, embora essa necessidade pessoal seja justa no papel, entendo que também seja justo que as outras pessoas não tenham a obrigação de reciprocar a dedicação à relação construída, isso sem contar a máxima de que devemos fazer as coisas sem esperar algo em troca. De onde enxergo a situação, isso é sintoma da falta de humanidade e do egoísmo que a vida contemporânea e o capitalismo infligem sobre a sociedade. Não acredito que todas as pessoas de quem eu espero recíproca sejam más ou não gostem de mim, mas acho q

Controlar os meios de educação é a verdadeira revolução

Estamos na temporada de ENEM e de vestibulares - e, sob o risco de soar como um idoso falando “no meu tempo…”, dos 16 aos 22 anos a minha vida girava em torno disso. Mesmo tendo nesse período o meu primeiro relacionamento, minhas três (!) primeiras experiências acadêmicas, algumas viagens interestaduais, o surgimento e o fim de amizades marcantes, situações em que me meti a cantar na frente de pessoas no que era descrito como um “show”, traumas familiares e a minha introdução à psicoterapia, nada mais existia além da questão de vida ou morte que era entrar na universidade. Fiz vários vestibulares, por vários motivos: medicina (para agradar ao pai, médico), arquitetura (para agradar aos pais, que queriam algo rentável), direito (por sugestão dos pais), física (porque achava que queria trabalhar na NASA, provavelmente fazendo robôs de alta rentabilidade para o Luciano Szafir) e ciências da computação (se alguém souber o motivo, por favor, me conte). Acabei cursando um mês de direito (IES

Quase metade dos perus votou a favor da ceia, vejam só

Postei os seguintes devaneios no meu Twitter, @eduardopaulo. Todos concernem as eleições de hoje, principalmente de um ponto de vista catarinense. Nenhum deles tem valor que não seja uma opinião tão qualificada quanto a de qualquer cidadão. ---------------------------------------- Almocei, fiquei vadiando e resolvi tirar uma soneca prolongada a uma hora do começo da apuração. Acordei ainda há pouco. Provavelmente destruí a minha noite de sono, mas me poupei de uma ansiedade enorme durante a apuração. ---------------------------------------- Nas eleições pra prefeito de Floripa em 96, todas as pesquisas apontavam um 2o turno totalmente de direita. O resultado: Afrânio, à época do PT, que oscilava entre 3o e 4o nas pesquisas, foi pro 2o turno. Me parece muito similar ao que ocorre com o Décio hoje. Bom sinal. Décio vai perder o 2o turno, mas Lula conseguiu carregar sozinho um candidato pouco popular num estado historicamente fascista graças à sua imagem forte e a uma direita fragmentada.

O peru vota contra a ceia

É prepotente de minha parte achar que o mundo precisa deste ensaio. Ninguém pediu que um sujeito consideravelmente desqualificado - sim, mais um! - opinasse quanto às eleições presidenciais. Mas faz parte da democracia que o peso do voto de cada um de nós seja igual, é moralmente justo que assim seja e é dessa forma que vejo esta egotrip. Nela eu boto a boca no trombone e justifico a minha escolha (extremamente previsível). A quem estiver disposto a ler obviedades pensadas por um cidadão de confiança discursiva exageradamente injustificada, seguem alguns parágrafos. As campanhas presidenciais de 2022 e a nossa sorte estão oficialmente lançadas. Existem dúvidas quanto ao comparecimento de alguns candidatos aos debates que precedem o pleito, mas acho desnecessário o circo. Nunca estivemos tão cientes de históricos políticos, temperamentos e ideologias dos concorrentes, e os debates servirão apenas para dar plataforma aos piores aspectos de cada um deles. Ficarei muito surpreso se eles nã

Sobre depressão, novamente

Depois de quatro anos bem, voltei a ter depressão. Engraçado. Fiz 34 anos segunda-feira e tenho depressão diagnosticada desde os 22. Muitos achariam que a essa altura eu teria experiência o bastante para saber quando um episódio começa a se aproximar, e quem sabe até um mínimo de inteligência que me permita correr atrás do que contenha o seu progresso antes que seja tarde. Mas tal qual suas outras ocorrências, a depressão veio silenciosa: demorou a disparar o alarme da casa e não derrubou nada muito barulhento antes disso. Senti dias de solidão, busquei atenção, deixei de sentir prazer com coisas das quais gosto, comecei a perder esperança e vontade de viver, e mesmo assim eu só me dei conta dela três dias atrás. Mesmo 12 anos depois do primeiro diagnóstico não deixa de me fascinar como a doença se manifesta. Ela afeta cada pessoa de maneira ligeiramente diferente, mas comigo sempre foi da mesma forma ‐ ela reconfigura as minhas prioridades, perspectivas e necessidades, além de me deix

Toma que o filho também é teu

Não cabe aqui um preâmbulo enrolado; o que tenho a dizer com o texto de hoje deve ser exprimido com todas as letras, tão cedo e tão alto quanto possível: não gostar de crianças é um lapso de empatia no seu nível mais fundamental, e excluí-las de espaços sociais é discriminação e, muitas vezes, machismo aplicado. Agora sim, segue o ensaio com todas as firulas habituais: Um tempo atrás vi um post no Instagram sobre não ser permitido não gostar de crianças. Li, concordei e compartilhei nos stories. Raramente uma viva alma responde ao que posto nas redes sociais (este blog é só mais um grandíssimo exercício de futilidade), mas desta vez obtive pelo menos umas dez respostas, todas em objeção à minha posição - e todas vindas de pessoas ditas progressistas, decepcionantemente. Como era um tópico a respeito do qual tenho convicções fortes, resolvi contra-argumentar todas as pessoas até onde a conversa pudesse se estender. Todas elas vieram com os mesmos argumentos. De acordo com elas, crianças